Os projetos de lei facilitam a regularização de latifúndios rurais e do agronegócio e o sucateamento do INCRA pelo governo federal acelera este processo
Diversas organizações sindicais e sociais, entre elas a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), entregaram a parlamentares uma carta contra os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional, e que alteram regras da regularização fundiária no Brasil.
Nesta terça-feira, 13 de julho, a Câmara dos Deputados aprovou em regime de urgência a tramitação do PL 2.633/2020, conhecido como PL da grilagem, e que deve ser levado ao plenário em breve.
Na carta, as entidades afirmam que essa tramitação em regime de urgência, dos PLs 2.633/20 e o de n° 1.730/21 objetivam alterar regras referentes a regularização fundiária no país, facilitando a grilagem de terras, legitimando o regime de latifúndios, e que vai atacar diretamente as terras produzidas e não regularizadas de pequenos agricultores, comunidades e povos tradicionais, como indígenas, quilombolas, ribeirinhos e extrativistas.
Um dos trechos do documento afirma que “Regularizar uma área de 2.500 hectares de terra significa regularizar o latifúndio, uma grande propriedade, pois, a Lei n. 8.629/1993 dispõe que a propriedade que vai até 4 módulos fiscais é caracterizada como pequena propriedade, assim como a Lei n. 11.326/2006 considera que é agricultor familiar aquele que trabalha uma área de até 4 módulos fiscais. Propriedade com tamanho superior a 4 até 15 módulos fiscais é considerada média e não pode ser desapropriada (Constituição Federal, art. 185, I). Propriedades com áreas acima de 15 módulos fiscais são consideradas grandes propriedades, isto é, latifúndios. Portanto, regularizar 2.500 hectares, na região amazônica, onde o módulo fiscal vai até 100 hectares, significa regularizar área de 25 módulos fiscais.”.
A carta ainda reforça que, “A aprovação desses projetos de leis vai impactar, também, no aumento do êxodo rural, da expulsão do homem e da mulher do campo, com aumento substancial da violência, uma vez que o grileiro rico terá todos os papéis prontos, mesmo não possuindo a terra, e praticará atos de violência contra os pequenos da terra, aumentando o número de ameaças, de tentativas de assassinatos e de assassinatos com o objetivo de expulsar essas pessoas das áreas e territórios onde vivem, para se apossar da terra. Essa história de grilagens e de conflitos precisa ser combatida ao invés de fomentada, como se anuncia com tais projetos. A dívida social não será resgatada porque, na forma como está previsto no texto, as áreas das comunidades indígenas e quilombolas (estas cujas propriedades já foram reconhecidas pelo ADCT da CF, art. 68), ainda não reconhecidas pelo Estado brasileiro, poderão ser objeto de regularização por terceiros, levando à perda das terras ocupadas por esses povos e comunidades tradicionais há dezenas e centenas de anos. A reforma agrária – dever do Estado brasileiro expresso na CF (art. 184) – não será realizada, porque a decisão governamental é não realizá-la e, também, não haverá terras disponíveis uma vez que a regularização massiva estará concentrada nas mãos de pouca gente. Isto não é resgatar dívida social, mas aprofundar a dívida social com milhões de brasileiros e brasileiras que vivem na terra e da terra.”
Sobre isso, em entrevista a Agência Pública, a diretora de Articulação e Políticas Sociais da Associação Nacional dos Servidores Públicos Federais Agrícolas (CNASI), Marcela Machado, afirma que dentro do INCRA o cenário é de caos. Segundo ela, o órgão vive a pior crise orçamentária da sua história e a escassez de recursos é um motivo usado pelo governo para acelerar o que tem sido a única prioridade do INCRA, a regularização fundiária.
Marcela Machado ressaltou ainda durante a entrevista que “a titulação de lotes de assentamento e de ocupantes irregulares (ou mesmo ilegais) de áreas públicas tem se tornado a palavra de ordem na autarquia, em detrimento de outras atribuições, como a aquisição de terras e o desenvolvimento dos assentamentos de reforma agrária, já existentes.”
Marcela descreve um cenário no INCRA de ausência de recursos orçamentários, ingerências políticas, falta de pessoal, além da paralisação da reforma agrária. Em 2020, segundo a diretora, o INCRA teve um orçamento que equivalia a 66% do orçamento que tinha há vinte anos. E o quadro de servidores conta apenas com um terço do que tinha em 1990.
Confira no site da Contag a nota completa contra a PL da grilagem: http://www.contag.org.br/index.php?modulo=portal&acao=interna&codpag=101&id=14439&nw=1&mt=1&in=1
Assessoria de Comunicação da FETAG-PB, com informações da CONTAG