31 anos do ECA: Fórum Nacional lança manifesto em defesa dos direitos das crianças e adolescentes brasileiros

 

O Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (FNDCA) é uma articulação de Instituições da Sociedade Civil, que tem como missão garantir a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, por meio da proposição, articulação e monitoramento das políticas públicas e da mobilização social.

Como estratégia, temos como objetivo exercer o controle social do Estado Democrático de Direito, para construção de uma sociedade livre, justa, solidária e, que garanta os direitos fundamentais, sem distinções de religião, gênero, orientação sexual, étnico-racial, ideológicas, partidárias, nacionalidade, campo, floresta e águas, povos e comunidades tradicionais e outras especificidades.

Em 2021, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 31 anos, e, neste cenário, o FNDCA reconhece conquistas e avanços inerentes a políticas públicas para crianças e adolescentes, e se compromete permanentemente em denunciar os retrocessos e violações aos direitos no atual contexto político.

Estamos em tempos de defender não só direitos, mas sim a vida e dignidade para a população, em especial para crianças e adolescentes. Padecemos com a insurgência da pandemia da Covid-19, que tem trazida uma nefasta realidade por conta das mais 500 mil mortes no Brasil, muitas das quais evitáveis não fosse a política da mentira e da morte promovida pelo atual Presidente da República, e que o país é o segundo com mais mortes de crianças pela doença no mundo segundo dados do Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (Sivep-Gripe).

Conforme dados de Boletins Epidemiológicos do Ministério da Saúde, em 2020, houve 14.332 casos e 1.180 óbitos em crianças e adolescentes no ano de 2020, enquanto de janeiro a maio de 2021, contabilizam-se 9.335 casos e 734 óbitos, nesses dados oficiais; o que se pode ocorrer subnotificação e compatibilização de outras metodologias de reais situações nos Estados e Municípios.

Órfãos pela COVID e Saúde Mental de Crianças e Adolescentes

Contribuição: Conselho Federal de Psicologia – CFP

A pandemia, decorrente do COVID-19 tem impactado a vida de muitas crianças e adolescentes em decorrência da mortalidade de seus progenitores ou responsáveis e, esta situação de orfandade, tem crescido como fenômeno social, deixando em situação de vulnerabilidade um número presumivelmente alto de órfãos. Diante disso, destaca-se a importância de uma atuação coordenada das instituições do Sistema de Garantia dos Direitos das Crianças e Adolescentes, para resguardá-los de todas as formas de negligência, em especial aquelas relacionadas à orfandade bilateral ou mesmo de um/a único/a responsável. Nessas situações cabe ao estado a responsabilidade da garantia de cuidados, afetos e proteção integral. É necessário identificar essas crianças/adolescentes e ofertar os cuidados necessários, afiançando as seguranças de renda, convívio familiar e social, apoio e acolhida.

Destaca-se a necessidade de expansão das ofertas de serviços de saúde mental de crianças e adolescentes, já considerada insuficiente antes da pandemia, e frente a conjuntura atual exige também a ampliação do investimento em saúde mental e na formação de profissionais, vez que essas ações poderão reduzir o impacto psicossocial da pandemia.

Além dessas medidas é importante afastar os investimentos em institucionalização, apostando na ampliação do acesso a serviços territoriais, além de garantir o investimento em pesquisas para monitoramento e acompanhamento das ações.

Na esteira do projeto genocida em curso no Brasil, que asfixia o Sistema Único de Saúde (SUS), e no qual já vivíamos um subfinanciamento, precarização e terceirização do trabalho, a atenção à saúde mental de crianças e adolescentes deve se dar no contexto de apoio ao modelo comunitário de cuidado em saúde mental a fim de produzir respostas na robustez necessária. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) tem um lugar ativo no cenário pandêmico, garantindo o que é essencial na assistência apostando em ações transformadoras dos contextos de produção de exclusão e sofrimento. Assim, crianças e adolescentes devem ser cuidados em liberdade.

Precisamos de fortalecer esse enfrentamento, com a cobrança para que existam esforços institucionais e governamentais para a garantia e planejamento pela vacinação para crianças e adolescentes, apesar de estudos e análises na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) ainda em andamento, o que se espera que em curto tempo sejam disponibilizadas para crianças e adolescentes, como ocorrem em alguns países, em especial para as que possuem deficiência por conta da maior vulnerabilidade, pois também correm riscos e serem transmissores desse perigoso vírus, seja em casa, nas escolas e em ambientes comunitários.

De certo, contra todas as adversidades, a infância e adolescência sobreviverão e seus direitos conquistados democraticamente pelo ECA sejam efetivados, em destaque, algumas delimitações a seguir colocadas.

Participação de Crianças e Adolescentes

Contribuição: Comitê de Participação de Adolescentes do CONANDA (CPA)

A participação constitui um direito humano de todas as pessoas, inclusive das crianças e adolescentes.

Por esta razão o direito à participação de crianças e adolescentes é um dos princípios da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança e, devido à sua importância, foi incorporado no Artigo 16 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Várias iniciativas têm sido implantadas para promover o direito à participação de crianças e adolescentes nos espaços de discussão, a criação de Comitês Consultivos de Adolescentes e/ou Fóruns de Adolescentes vinculados aos Conselhos Nacional, Estaduais e do Distrito Federal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

No Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) é importante destacar como um grande avanço a criação do Comitê Permanente de Participação de Adolescentes (CPA), integrado por 47 adolescentes de todo território nacional e grupos sociais diversos. Com o CPA o Conselho Nacional pretende consolidar e fortalecer o processo participativo nas suas discussões por meio da presença de adolescentes

Apesar dos recentes avanços, o Brasil ainda precisa refletir sobre essa participação, buscando construir novas formas de participação que cheguem aos mais diversos espaços e sejam capazes de incluir a diversidade que crianças e adolescentes têm como características. Assim, eles poderão contribuir de fato para a transformação social e a mudança na cultura política. Dessa forma, é fundamental que as ações neste sentido concentrem esforços na promoção da proteção integral às crianças e aos adolescentes para garantir a sua participação ativa na luta pelos direitos humanos.

Educação

Contribuição: Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), e Central Única dos Trabalhadores (CUT)

O direito à educação pública e gratuita é uma conquista da sociedade brasileira e garantiu, no texto da Constituição de 1988, como política pública universal às nossas crianças e adolescentes, o acesso e a permanência em uma escola perto de sua residência. A educação como direito social fundamental de todo cidadão é também dever do Estado e, conforme inscrito em nossa Carta Magna, deve ser promovida em colaboração com toda a sociedade, a fim de fomentar o pleno desenvolvimento de nossas crianças, adolescentes e jovens, prepará-los para a cidadania e capacitá-los para o trabalho.

Os avanços da sociedade brasileira em assegurar o acesso universal a todos os brasileiros a uma escola e a uma educação de qualidade encontram hoje barreiras na efetiva garantia de aprendizagem de nossas crianças e adolescentes. A falta de recursos públicos orçamentários adequados impacta no afastamento de muitos estudantes da escola, quando não são asseguradas as suas condições de permanência, que envolvem transporte, alimentação e acolhimento no espaço escolar de todas as diferenças. A garantia de acesso e permanência a uma escola pública, gratuita, inclusiva e de boa qualidade às nossas crianças e adolescentes brasileiras é desafio primeiro de todos os governantes e também das famílias e sociedade em geral em assegurar a educação como direito.

A contrario sensu, processo de militarização das escolas que o Brasil experimenta atualmente representa um esforço governamental em transferir a gestão administrativa e pedagógica de escolas civis do Brasil às forças militares. Surge como política nacional que autoriza vários Estados da Federação brasileira a executar, no âmbito estadual, processos de militarização das escolas nos sistemas públicos de ensino próprios. Por meio de convênios e outras modalidades, os governos estaduais passam a gestão de várias escolas de suas redes educacionais públicas, por meio de parcerias, mecanismos e arranjos legais diversos, para as suas forças militares, que basicamente são as corporações de polícia que cada Estado conta em sua estrutura de governo.

O experimento de militarização das escolas brasileiras tem se imposto de forma quase que prioritária nas áreas periféricas onde vivem as crianças negras mais pobres e as populações mais vulneráveis. Escolas militarizadas passaram a ocupar no Brasil, prioritariamente, as áreas mais pobres e desprovidas de qualquer amparo assistencial do Estado, compondo a cena das periferias e favelas de nossas cidades. Representa um ataque sem precedentes à escola pública e aos próprios professores, além de gerar mais exclusão e preconceito no ambiente escolar. Trata-se mesmo de um projeto que criminaliza as infâncias pobres e periféricas de nossas cidades que ameaça, com muita força, a educação pública como direito social.

Em outra investida bastante questionável, os governos começam a fomentar a educação domiciliar como uma possibilidade às famílias para atacar a escola pública universal e gratuita como direito de todos. A escola, que deve ser um espaço de proteção das crianças e adolescentes, passa a ser ameaçada pela ideia de educação domiciliar, que compromete o seu direito à uma convivência social diversa e acesso a visões de mundo plurais. Além do mais, a não obrigatoriedade de frequência à escola inviabiliza a identificação de casos e amplia as possibilidades de ocorrência de violência doméstica e sexual, além de favorecer que crianças com deficiência sejam retiradas da escola e, com isso, do convívio social, legitimando que instituições recusem a matrícula desses estudantes. É um ataque sem precedentes à ideia de uma escola inclusiva.

A educação domiciliar não é uma alternativa viável para a maioria da população. É um projeto elitista e que não desperta nenhum interesse coletivo da maioria das pessoas. A educação domiciliar, assim, ameaça a escola como um local de oportunidades igualitárias para novas aprendizagens, de interação e respeito às diversidades. Somente a escola possibilita o convívio social e, nela, crianças e adolescentes aprendem a reconhecer e respeitar as diferenças e a conhecerem outras visões de mundo. Privar crianças e adolescentes do direito à escola é restringir o exercício da cidadania e representa um ataque à educação como direito social.

Violência Sexual

Contribuição: Ordem dos Advogados do Brasil – OAB

A sociedade brasileira cada vez mais precisa assumir a responsabilidade de prevenir e enfrentar a violência, a exploração e o abuso sexual praticado contra crianças e adolescentes no Brasil. A violência sexual, em todas suas formas, representa expressão mais dolorosa para crianças e adolescentes vitimadas, e devendo ser inaceitável pela sociedade, mas também outros tipos de negligências que acontecem. Portanto, a mobilização deve permanecer e, sabemos que ela jamais acabará. O que faz esta mobilização ainda mais importante, é o envolvimento de todas aquelas entidades e pessoas que trabalham na defesa dos direitos da criança e do adolescente.

Nesse sentido, reforçar sempre a campanha anual Faça Bonito, em alusão 18 de Maio, promovendo a reflexão social coletiva sobre os avanços e desafios acerca do Tema, compõe agenda permanente dos que militam em favor dos direitos da criança e do adolescente. Igualmente, há que monitorar a efetivação dos Planos temáticos, em todos os níveis, valorizando-se a atuação autônoma pelos Conselhos de Direitos e articulação da sociedade civil, com o compromisso da participação e organização das próprias crianças e adolescentes.

É preciso garantir a toda criança e adolescente o direito ao seu desenvolvimento de forma segura e protegida, livres do abuso e da exploração sexual, cabendo sempre constar em discussões de estratégias para prevenir e enfrentar essa violência, um problema que assola não só o Brasil, mas o Mundo, ainda mais escamoteada no atual tempo de pandemia, cujos todos os olhares não se podem desviar.

Trabalho Infantil

Contribuição: Ordem dos Advogados do Brasil – OAB

Convocar a sociedade para a mobilização e o debate público sobre a chaga social do trabalho infantil ainda é colocada anos após anos, nesta violência que retira direitos de crianças e adolescentes de todo o mundo. Segundo a meta global das Nações Unidas prevista no ODS 8.7 (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável), propõe que até 2025 os países signatários erradiquem o trabalho infantil, principalmente, nas suas piores formas.

No entanto, o desemprego, a naturalização de algumas formas de trabalho infantil, os impactos socioeconômicos da pandemia da COVID-19, além da falta de políticas públicas eficazes, têm impedido avanços, ou pior, pela primeira vez em 20 anos, estagna o progresso para a erradicação do trabalho infantil conforme demonstra os dados publicados nesta semana pelo relatório “Trabalho Infantil: Estimativas Globais 2020, tendências e o caminho a seguir” do Unicef e OIT sobre o tema.

A naturalização do trabalho infantil intrafamiliar e em suas piores formas invisibilizam boa parte das crianças e adolescentes que estão “a serviço” das próprias famílias, em detrimento do direito de estudar, brincar e se desenvolver de forma saudável. Crianças e adolescentes que acabam sendo obrigadas a contribuir com o sustento de famílias vulnerabilizadas pela falta de proteção social, desemprego dos adultos, escolas fechadas e tantas outras problemáticas agravadas, tanto pelo advento da Covid-19, quanto pela escalada crescente de uma parcela da sociedade, orquestrada por adultos que foram crianças e adolescentes trabalhadores, que naturalizam esta violação de direitos.

Ou seja, são muitos outros fatores são um risco e impedem os avanços para se eliminar ou erradicar o trabalho infantil. Faz necessária a implementação urgente de uma educação de qualidade para as crianças pobres de nosso país; educação em tempo integral como uma forma de evitar o trabalho no contraturno; e convivência familiar que não corresponda a trabalho doméstico, como algumas das estratégicas para ao menos mitigar este mal presente em nossa realidade.

Aprendizagem profissional

Contribuição: Instituto Fé e Alegria, e Rede Cidadã

O direito à profissionalização do adolescente encontra previsão, com prioridade absoluta, na Constituição Federal, assim considerado direito fundamental no país. Da mesma forma, o ECA também prevê o direito à aprendizagem, de forma alinhada ao princípio da proteção integral à criança e ao adolescente. Estas previsões encontraram até então sua melhor implementação na Lei de Aprendizagem (L. 10.097/2000), que tem se revelado uma das políticas públicas mais relevantes ao proporcionar inclusão social, geração de renda, educação e profissionalização de forma integrada, através do primeiro emprego para a juventude. Um exemplo de legislação bem-sucedida, que, no entanto, ainda precisa ser ampliada em sua eficácia e impacto social, já que o número de jovens contratados ainda fica muito abaixo no piso previsto pelas cotas mínimas, subutilizando o potencial de oportunidades da política.

A jovem aprendiz Gabrielle de Jesus reflete: “Nós, jovens, somos o futuro do Brasil, sem essa oportunidade, a gente não vai ter outra forma de ingressar no mercado de trabalho.” Grande parte dos adolescentes, em especial os mais vulneráveis, ainda se encontram em situação de trabalho irregular e evasão escolar. Essa realidade pode começar a ser superada pela expansão do programa de Aprendizagem, com fiscalização e contratação nos patamares que a lei já prevê, contribuindo assim como estratégia de erradicação do trabalho infantil, e promovendo a realização das garantias dos direitos previstos no ECA.

Sistema Socioeducativo

Contribuição: Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares – GAJOP

A Constituição Brasileira de 1988 consagrou a Doutrina da Proteção Integral, reconhecendo a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, em condição peculiar de desenvolvimento, merecedores da atenção e resguardo da família, da sociedade e do Estado. A partir dessa concepção de sujeitos de direitos, o Estatuto da Criança e do Adolescente concebeu um sistema próprio de responsabilização do adolescente baseado na compreensão da socioeducação, que imputa as consequências lesivas do ato infracional aos adolescentes por meio do incentivo à reparação e à integração social e garantindo seus direitos fundamentais individuais e sociais, por meio da Lei Federal 12.594. de 18 de janeiro de 2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).

No entanto, as garantias advindas da Doutrina da Proteção Integral não foram suficientes para romper com a relação estabelecida e propagada entre juventude, pobreza e criminalidade por instituições de controle social, ou incidir sobre a lógica de atendimento aos adolescentes a quem se atribui a prática de atos infracionais, ao revés: projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional nesse período também expressam uma visão punitiva que encontra eco nas políticas repressivas de estado, como a redução da maioridade penal e o aumento do tempo de internação.

Ao saudar os 31 anos do ECA, defendemos uma mudança drástica do modelo de execução da política socioeducativa no Brasil, que permita uma transformação da lógica menorista, que hoje prioriza o encarceramento, o tratamento desumano e o reforço do estigma do adolescente autor de ato infracional. Para uma lógica amparado no princípio da proteção integral, que respeite a individualidade, o sujeito de direitos, pondo-o a salvo os adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa sob a guarda estatal, de qualquer tratamento humilhante, vexatório ou constrangedor.

Extermínio da adolescência e juventude

Contribuição: Associação Nacional de Centros de Defesa da Criança e Adolescentes (ANCED)

O Estatuto da Criança e do Adolescente faz 31 anos, fruto da luta de muita gente comprometida com a infância e adolescência, especialmente dos meninos e das meninas de rua, da periferia, que se organizaram, fizeram barulho nas ruas e praças em uma grande movimentação para a sua aprovação. A prioridade absoluta conquista dessa meninada que não fugiu da luta, não admite retrocessos, a memória dos que já se foram nos impelem a seguir lutando até que todas as crianças e adolescentes sejam livres, iguais, sem violência e com seus direitos composicionais garantidos.

Neste contexto, o Relatório sobre o Extermínio de Adolescentes e Jovens no Brasil produzido pela Associação Nacional de Centros de Defesa da Criança e Adolescentes (ANCED) em 2020 registrou-se que os adolescente e jovem mortos quase sempre não tiveram oportunidade a uma educação desde a sua infância. A maioria das vítimas tem apenas a escolaridade básica e muitas vezes sem até concluir o primeiro grau. Isso mostra o quanto o Brasil é desigual. Os jovens negros e com baixa escolaridade são os maiores alvos no país que mais mata no mundo.

É URGENTE garantir a execução de políticas efetivas que proporcione uma educação digna a todas e todos, modificando o contexto de extermínio da população mais jovem e vulnerável.

Crianças e Adolescentes dos campos, da floresta e das águas

Contribuição: Movimento de Organização Comunitária (MOC) e Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG)

Nestes 31 anos de ECA, as populações do campo, da floresta e das águas, tiveram conquistas importantes, com destaque para as políticas públicas de seguridade social na Constituição Federal de 1988, saúde, previdência, assistência e a educação como um direito de todos, dever do Estado e da família. Ressalta-se ainda, a criação do Programa Nacional de Educação do Campo – PRONOCAMPO em 2010.

Estas conquistas foram importantes como forma de contribuir para o alcance das ações e deliberações do ECA, no entanto, o ajuste fiscal e o teto de gastos, impostos pela Emenda Constitucional Nº 95 aprovada pelo Congresso Nacional em dezembro de 2016, acrescido da política de austeridades fiscal do atual governo são fortes ameaças a e estas conquistas e outras políticas públicas essenciais para o desenvolvimento do campo, em especial, as voltadas para a ampliação e fortalecimento da agricultura familiar, da reforma agrária, da educação e saúde do campo, dentre outras.

Desta forma, ampliam-se os desafios que precisam ser superados para as crianças e adolescentes do campo, da floresta e das águas, principalmente, o combate as desigualdades sociais, a violência e a erradicação do trabalho infantil.

Medicalização excessiva da Criança e do Adolescente

Contribuição: Conselho Federal de Psicologia – CFP

A criança e o adolescente devem ser destinatários preferenciais de políticas públicas, sobretudo as relacionadas ao seu desenvolvimento sadio e harmonioso pleno. Muitas vezes, entretanto, o que parece ser cuidado constitui mesmo afronta às próprias premissas da proteção integral da infância, e outros interesses, que passam ao largo da primazia do interesse da criança e do adolescente, sobretudo financeiros, revestem-se muitas vezes de propaganda protetiva da infância. Esse parece ser precisamente o caso corriqueiro da excessiva medicalização da infância, sobretudo o que ocorre no âmbito escolar: ante a qualquer problema quotidiano, parece haver uma grande facilidade para diagnosticar uma patologia correspondente, e, para a patologia, sempre há um remédio.

Note-se que a tendência é corriqueira, mas está muitíssimo longe de ser um problema banal. A facilidade de prescrição de drogas para crianças e adolescentes com a mera finalidade de controlar comportamentos indesejados não se coaduna com a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente (ECA, art. 17). Nesse sentido, os casos mais graves parecem ocorrer precisamente em sistemas socioeducativos, em que, comumente, drogas psicotrópicas são ministradas aos internos com a famosa finalidade “sossega leão”. A criança e o adolescente devem ser prioridade absoluta e, por esse motivo, não podem ser mero objeto de controle químico por conveniências institucionais.

Conselho Tutelar

Contribuição: Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR

Ao celebrar os 31 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) fazemos memória das histórias de militância e luta pela consolidação dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes no Brasil. Neste cenário os conselheiros tutelares vêm se consolidando como a categoria com maior visibilidade junto a comunidade em geral, ainda que a percepção da população não corresponda necessariamente ao papel designado pelo ECA, certamente são a primeira categoria a ser lembrada quando o tema é direitos da criança e do adolescente.

No entanto, a visibilidade alcançada junto à população, não tem implicado em reconhecimento e valorização junto aos gestores municipais. Infelizmente ainda é possível encontrar conselhos tutelares funcionando em espaços inadequados com equipamentos em condições precárias e ausência de meios de transporte para o exercício pleno de suas funções. Tal situação segue como marcador importante de que a mobilização dos diversos atores, que se fizeram presentes nestes 31 anos de luta por direitos, segue atual e necessária para que as políticas públicas sejam cada vez mais concretas e efetivas nas comunidades e na vida de milhões de crianças e adolescentes que ocupam o território brasileiro.

Situação de Rua de Crianças e Adolescentes

Contribuição: Rede Nacional Criança não é de Rua

Nenhum direito a menos! Sigamos em luta com as crianças e adolescentes em situação de rua! Ocupemos mais espaço na agenda política do país. Estamos celebrando 31 anos do ECA em meio a uma crise econômica, social, humanitária e pandêmica sem precedentes na história brasileira e mundial. Nesse contexto, explode a presença de meninos, meninas e suas famílias em situação de rua no território nacional, privados dos mais básicos direitos. Incidamos para a formulação de políticas públicas que enfrentem a situação de rua de crianças e adolescentes.

Para isso, há que se ressaltar movimentos e articulações interinstitucionais, a exemplo da atuação da Rede Nacional Criança Não É de Rua (CNER), no sentido de defender o direito à convivência familiar e comunitária, a Educação Social de Rua, os serviços especializados no atendimento a esse público, a produção de diagnósticos quati-qualitativos sobre crianças, adolescentes, adultos e famílias em situação de rua, a equidade de raça, gênero, classe, participação e o direito à moradia primeiro para quem vive em situação de rua.

Como marco temporal, até 2030, quando celebraremos os 40 anos do ECA, sejam postas em práticas na íntegra as Diretrizes Nacionais para o Atendimento a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua, aprovadas pelos CONANDA e CNAS, para que, assim, sejam gerados frutos por todo o país, principalmente nas metrópoles e nas grandes cidades brasileiras.

Crianças e Adolescentes com Deficiência

Contribuição: Federação Nacional das Associações Pestalozzi

São 31 anos do ECA somando-se na proteção e garantia dos direitos da criança e do adolescente com deficiência, marco fundamental para que todos acessem a rede de proteção, onde devem ter sua individualidade e especificidade respeitadas, ouvidas as suas necessidades, garantindo o direito da criança e adolescente com deficiência a ser atendida na sua integralidade e conviverem em harmonia com a sociedade, não sofrendo tratamento desumano, violento ou vexatório em razão de sua deficiência.

É fundamental registrar que o ECA não permite discriminação de qualquer tipo para com a criança e adolescente com deficiência. Estes tem o direito inerente ao Lazer, Cultura, Esporte, Diversão, Informação, Segurança, Educação, Saúde, Alimentação, Núcleo Familiar e Social, Convivência, Sociabilidade e Tomada de Decisões.

O ECA trouxe muitos avanços na defesa e garantia de direitos, mas ainda temos muito a avançar oportunizando mais atendimentos especializados na área da educação e saúde, efetivando as proteções e direitos garantidos, principalmente da criança e adolescente com deficiência, visto que, ainda são muitas vezes invisibilizados pela sociedade como um todo, infelizmente.

A inclusão, participação, protagonismo, autonomia e melhoria da qualidade de vida é parte inerente da garantia de acesso e direito da criança e adolescente com deficiência, e deve ser uma busca constante de todos nós.

Financiamento da Política da Criança e do Adolescente

Contribuição: Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Centro de Educação e Cultura Popular (CECUP)

O ECA previu, no artigo 88, inciso III, a criação de fundos municipais, estaduais e nacional como ferramenta para possibilitar o financiamento da política nacional da criança e do adolescente, uma forma inteligente de permitir que a família, a sociedade e o Estado, pudessem cumprir com seu papel na proteção integral, desta forma oportunizando a participação de tod@s as pessoas e organizações, estatais ou não.

Nos primeiros anos de vigência, a ferramenta mostrou-se inócua, permanecendo os fundos sem fundos, até que se iniciou um movimento para permitir que as empresas que desejassem direcionar recursos do Imposto de Renda (IR) aos fundos, pudessem indicar os projetos que desejariam apoiar.

O Ministério Público Federal arguiu a ilegalidade da utilização dos arts. 12 e 13 da Resolução n.º 137/2010-CONANDA como instrumento utilizado pelo Conanda para regulamentar a prática, instaurando uma ação judicial.

A prática da destinação do IR aos fundos com a indicação de projetos a serem apoiados, provocou um aumento considerável nas captações em todos os níveis de governos, promovendo também a visibilidade do Fundo Nacional, que hoje acumula recursos próximos a 100 milhões, porém a aprovação da Lei do Teto dos gastos, no Governo Temer, permitiu que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos recentemente apresentasse proposta orçamentaria anual com valores ínfimos, incapaz de atender as reais necessidades.

Denúncias tem sido realizadas todos os anos, porém, desde 2016, por 05 (cinco) anos, consecutivos o Fundo Nacional tem atuado com orçamentos inadequados, que sequer permitem lançamento de editais de projetos, provocando a sanha de parlamentares desatentos, que a todo momento apresentam projetos de Lei que tentam fragilizar ainda mais o Fundo Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.

CONCLUSÃO

Contribuição: Sociedade Brasileira de Pediatria

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 31 anos. Lembra-se, neste momento histórico, de Bertolt Brecht:

“Não diga nunca ‘isto é natural’. Perceba o horrível atrás do que já se tornou familiar. Sinta o que é intolerável no dia a dia que se aprendeu a suportar. Inquiete-se diante do que se considera habitual, conheça a lei e aponte o abuso. E, sempre que o abuso for encontrado, encontre o remédio”.

Como conquista, temos a recente retomada do CONANDA, que por seis meses ficou na inatividade, e a Sociedade Civil articulada pelo FNDCA tomou à dianteira para que este importante espaço de participação social e popular não fosse fechado: E NÃO FOI, NEM SERÁ!

Dentre os diversos artigos do ECA, como forma de sintetizar o cenário atual e mais desafiante, apontamos o art. 4.ª contra o intolerável que atingem nossas crianças e que de forma abusiva tornou-se familiar em algumas situações nos dias atuais. Em combate, a aplicação do Art. 4°, que descreve sua primazia contra o desprezo encontrado em algumas políticas públicas:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com ABSOLUTA PRIORIDADE, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) Primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) Precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) Preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) Destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

E é essa ABSOLUTA PRIORIDADE que não devemos deixar de exigir e buscar, do contrário, toda a luta em favor da democracia, da cidadania e dos direitos humanos para criança e adolescentes correm sérios riscos de serem colocados em segundo plano, ou lugar inóspito e fétido, como alguns agentes públicos parecem desejar.

Ao apontar para a aplicação do ECA, resgatamos o nosso passado, fortalecemos a luta no presente e apontamos para um futuro melhor, para todas as expressões e alcance das infâncias e adolescências que a pauta exige, a par de todas as diversidades e universalidades de crianças e adolescentes.

ECA 31 ANOS. Por mais conquistas. Contra retrocessos.

Brasília, 13 de julho de 2021.

Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – FNDCA

COLABORARAM COM ESTE MANIFESTO COLETIVO:

– Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente – ANCED

– Comitê de Participação de Adolescentes do CONANDA

– Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação

– Conselho Federal de Psicologia

– Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares – GAJOP

– Federação Nacional das Associações Pestalozzi

– Instituto Fé e Alegria

– Movimento de Organização Comunitária – MOC

– Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua

– Rede Cidadã

– Rede Criança não é de Rua

– Sociedade Brasileira de Pediatria

– Maristas

– Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares – CONTAG

– Central Única dos Trabalhadores – CUT

– Ordem dos Advogados do Brasil – OAB

– Centro de Educação e Cultura Popular – CECUP

– Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade – CONTRATUH

FONTE: Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – FNDCA

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