“Abordando as necessidades de capacitação das mulheres e reforçando seu papel de liderança na agricultura familiar” foi o tema da sessão de intercâmbio online realizada ontem, 20 de julho, pelo Fórum Rural Mundial (FRM) com apoio da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), e foco no Pilar 3 transversal do Plano Global de Ação da Década da Agricultura Familiar.
O intercâmbio contou com a participação de três organizações de distintos continentes, entre elas a CONTAG, que apresentaram casos de processos de capacitação voltados para mulheres que essas entidades coordenam em seus territórios, e que, a partir de seus resultados positivos, possam ser exemplo de boas práticas para outras organizações e países na perspectiva do desenvolvimento sustentável com recorte de gênero.
A CONTAG foi indicada pela COPROFAM – Confederação de Organizações de Produtores Familiares do Mercosul Ampliado, organização internacional da qual é filiada, para apresentar sobre a Marcha das Margaridas, visto que hoje esta atividade é reconhecida como a maior mobilização política de mulheres rurais da América Latina. A secretária de Mulheres da CONTAG, Mazé Morais, foi quem esteve no intercâmbio virtual, apresentando os detalhes sobre a construção dessa mobilização feminina e feminista que há 22 anos é coordenada pela Confederação e protagonizada por milhares de agricultoras familiares brasileiras.
Antes de falar sobre a Marcha em si, Mazé resgatou a história da CONTAG com a implementação de cotas para as mulheres em sua Diretoria, que em 1998 era de, pelo menos, 30% de ocupação obrigatória de dirigentes mulheres, e que hoje é de 50%. E nesse mesmo sentido, também se estabeleceu cotas obrigatórias de participação de mulheres em todos os eventos de formação política e sindical da entidade.
Ações como essas abriram caminhos para debates direcionados à formação política de mulheres como eixo estratégico da CONTAG. E, aos poucos, foi se construindo uma grande agenda baseada nesse princípio, que culminou na Marcha das Margaridas e em um curso exclusivo para líderes sindicais e agricultoras familiares de todo o Brasil. De forma objetiva, Mazé Morais explicou a todas as participantes do intercâmbio internacional sobre cada estrutura utilizada para a construção da Marcha das Margaridas, que tem esse nome em homenagem à Margarida Alves, líder sindical assassinada em 1983.
“A Marcha das Margaridas é um espaço de formação na ação, que tem uma dimensão pedagógica e feminista. Soma-se a isso uma atividade de capacitação programada: o “Curso de Formação Política para Mulheres” que auxilia na construção de estratégias. A Marcha expressa essa relação intrínseca entre ação-organização-formação em seus processos formativos”, explicou a dirigente.
Mazé abordou ainda os conteúdos trabalhados nas formações, tais como “Estado, poder, democracia, sistema político, eleições – disputando e reafirmando o lugar da mulher”, “A organização e a luta das mulheres no Brasil, das mulheres do campo, bosques e águas e a Marcha das Margaridas”, “A importância da ação afirmativa”, entre outros. E apontou uma série de resultados desses anos de processo, entre eles a importante integração de cada mulher participante consigo mesma e com sua experiência de vida, complementada com um encontro das singularidades de cada uma com a singularidade das participantes, e como isso contribui para o fortalecimento de identidades políticas e da força política dessas mulheres.
Além da CONTAG, outras duas organizações falaram sobre seus projetos para capacitação de mulheres rurais: a ActionAid de Bangladesh, país do sul da Ásia, e a organização da África Central PROPAC – Plateforme Regionale des Organisations Paysannes d’Afrique Centrale. A primeira coordenou um projeto de fortalecimento das capacidades de lobby e negociação política de mulheres agricultoras, e a segunda buscou trabalhar a atuação das mulheres nas organizações representativas locais.
Ao comentar sobre as experiências apresentadas, a diretora do Fórum Rural Mundial, Laura Lorenzo, destacou: “Para o FRM é importante contar sempre com as capacidades que já há nas organizações, e buscar maneiras de reforçá-las, sem precisar criar novas. Eventos como esse são muito importantes para nós, pois incentivam a colaboração e o intercâmbio entre as mulheres e suas formas de se organizar”, afirmou a diretora.
As duas entidades organizadoras do evento, FRM e FAO, também tiveram momentos para apresentar sobre estudos que ambas estão desenvolvendo no contexto do Pilar 3 da Década. Enquanto a FAO apresentou sobre os programas de desenvolvimento de capacidades para o empoderamento das mulheres em que está trabalhando para reforçar a importância dessa pauta em diferentes partes do mundo, o FRM apresentou resultados de uma consulta que fez com 103 mulheres de 53 países que atuam como lideranças políticas.
A consulta buscou entender o contexto de capacitação dessas lideranças e que tipo de trabalho elas desenvolvem em suas organizações e países, para ter elementos que contribuam para desenhar políticas de capacitação mais funcionais e assertivas para a realidade das mulheres rurais em seus territórios.
Ao comentar sobre o tema do intercâmbio, Laura Lorenzo observou que há um conjunto de crises ocorrendo no mundo ultimamente que vem asfixiando os agricultores e agricultoras de diversas formas, e que esses desafios não serão superados se não for dado um protagonismo às mulheres, a partir de autonomia econômica, política e social delas em seus ambientes. “É preciso ampliar a participação delas nas organizações, nos diálogos públicos e em todos os programas que tem a ver com agricultura. O empoderamento e fortalecimento das lideranças femininas ajudam nesse processo”, afirmou Laura.
Fonte: Gabriella Ávila – Jornalista da COPROFAM