“A reforma agrária vale a pena e toda a sociedade ganha com ela”.
O secretário de Política Agrária da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) e assentado da Reforma Agrária no estado de Goiás, Alair Luiz dos Santos, fala sobre desafios, expectativas e da articulação para buscar caminhos que consolidem a agenda agrária no Brasil.
Por Barack Fernandes, Assessoria de Comunicação da CONTAG.
Confira a entrevista.
Assessoria de Comunicação da CONTAG – Alair, quais os problemas enfrentados pela CONTAG e movimentos sociais do campo que dificultaram e até inviabilizaram que a Política Agrária avançasse nos últimos anos no Brasil?
Alair – Em primeiro lugar é importante registrar que desde a invasão dos portugueses em 1500 a estrutura fundiária no Brasil é muito concentrada e isso permanece até hoje. Só para se ter uma ideia, de acordo com os dados do IBGE as áreas com menos de 10 hectares, mesmo sendo mais da metade do total de estabelecimentos, elas ocupam menos do que 3% das terras do Brasil, mas o latifúndio mesmo sendo minoria (não chega nem a 2% do total dos estabelecimentos) eles tem quase a metade das terras no país.
Agora, a partir das lutas a gente estava conseguindo fazer leis e criar políticas que estavam ajudando a diminuir essa concentração, mesmo que devagar, mas esse processo parou a partir de 2016 com o golpe. Teve muitas alterações na legislação e decisões de governo que paralisaram a reforma agrária. Só para termos uma ideia o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) expediu um memorando paralisando as ações de vistorias de novas áreas para a criação de assentamentos. Outro grande problema foi a diminuição dos recursos, tanto para investimentos em infraestrutura e créditos para as famílias já assentadas ou para aquisição de novas áreas.
Essa situação nos levou a entrar com uma ação no Superior Tribunal Federal para exigir que o INCRA cumprisse sua função. Saiba mais da ADPF 769 AQUI.
Assessoria de Comunicação da CONTAG – Qual perspectiva da CONTAG para política de reforma agrária com o governo Lula?
Alair – É muito importante que a gente acredite na mobilização permanente em primeiro lugar. É tarefa nossa, da CONTAG, das Federações, Sindicatos e outras organizações do campo fazer a pressão no governo, independente de qual for, para pautar nossas reivindicações. Acontece que no governo anterior a gente não conseguia estabelecer uma relação de diálogo e, além disso, era declaradamente contra as organizações que fazem a luta pela terra.
Com o novo governo a gente tem sinais que vamos conseguir a retomada das políticas de Reforma Agrária. Com a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar e a vinculação do INCRA junto a esse ministério vai ser possível reestabelecer o diálogo para garantirmos políticas às famílias assentadas e avançar na aquisição de novas áreas. Agora, uma coisa importante é a recomposição do orçamento do INCRA, o orçamento que o governo anterior deixou para o ano de 2023 é uma vergonha. A primeira grande mobilização vai ser para ter mais dinheiro no INCRA e isso tem que ser tarefa imediata, ainda para o primeiro semestre.
Assessoria de Comunicação – A luta pela reforma agrária é uma luta coletiva que exige muita unidade. Como estão as articulações com outras organizações do campo?
Alair – A CONTAG tem intensificado a articulação com as organizações, e podemos destacar a relação com o Campo Unitário que, inclusive, apresentou uma Plataforma para o governo Lula (Veja AQUI). Vale a pena destacar também a articulação com a Campanha Contra a Violência no Campo e a campanha A vida Por um Fio, duas campanhas que têm papel fundamental para acompanhar as pessoas e as comunidades que estão ameaçadas por fazerem a luta pela terra. Inclusive, a partir da relação com essas duas campanhas articuladas com o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), a Secretaria de Política Agrária da CONTAG participou de duas missões do CNDH, uma no Maranhão e outra em Pernambuco por conta da gravidade das ameaças e até do assassinato do menino Jonatas. (Assista ao vídeo AQUI)
Vale destacar ainda a articulação com a Campanha Despejo Zero que conseguiu através de decisão do STF a suspensão de despejos por quase dois anos e por fim definiu condicionantes para que os Tribunais de Justiça possam cumprir os mandatos de reintegração de posse (Saiba mais AQUI). Ainda na esfera do Poder Judiciário, a CONTAG entrou com duas Ações Direta de Inconstitucionalidade (ADI) exigindo que as terras públicas federais ou aquelas que são do governo federal e que foram repassadas aos estados, sejam destinadas prioritariamente para reforma agrária como manda a Constituição. As duas ações foram protocoladas em conjunto com a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e outras organizações do campo.
Assessoria de Comunicação da CONTAG – O que fazer para manter a mobilização e luta para efetivar a Reforma Agrária em nosso país?
Alair – Sem Reforma Agrária não é possível romper com as questões estruturantes que impedem a concretização do desenvolvimento sustentável e solidário e o combate à violência, à miséria e às desigualdades. Reforma Agrária deve ser de interesse de todo mundo e não apenas dos trabalhadores e das trabalhadoras rurais.
O Sistema Confederativo (Sindicatos, Federações e CONTAG) deu um importante passo para reafirmar nosso compromisso histórico com a luta dos trabalhadores e trabalhadoras pela reforma agrária ao aprovar a resolução que indica quais as políticas que a gente defende para a reforma agrária no país e orienta nossa ação sindical para contribuir nessa luta. (Leia a resolução AQUI)
Para finalizar quero reafirmar que a reforma agrária vale a pena e que toda a sociedade ganha com ela.