Má gestão da pandemia e crise econômica aumentam desafios da juventude rural no Brasil

 

Foto: Ubirajara Machado

Mais de 769 mil jovens entre 16 e 32 anos deixaram o campo entre 2018 e 2020, na comparação dos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) desses dois anos. Em 2018, contávamos com 7,5 milhões de jovens nessa faixa etária, contra apenas 6,7 milhões em 2020.

Entre as diversas razões para uma tão grande diminuição no número de jovens no campo, podem estar a morte pela Covid-19 ou por outras doenças ou acidentes que não encontraram leitos nas unidades de saúde, mas, principalmente, também a falta de perspectiva provocada por cortes sucessivos em políticas públicas básicas de educação, habitação, geração de trabalho e renda.

Consequências da PEC 95/2016

A justificativa do atual presidente da República e de sua equipe econômica é a falta de recursos e necessidade de “cortar despesas”, para continuar cumprindo o teto de gastos imposto pela PEC 95. Desde o golpe de 2016 os gestores públicos brasileiros ficaram cegos para a importância da agricultura familiar e do desenvolvimento sustentável do campo, e principalmente para a necessidade de garantir condições para a permanência digna de jovens que vão continuar produzindo 70% dos alimentos que vão para a mesa dos(as) brasileiros(as) todos os dias.

Mais de 484 mil jovens rurais entre 16 e 32 anos não estudam nem trabalham, de acordo com estudo do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) feito para a Secretaria de Jovens da CONTAG. Trata-se de um grande desperdício de talentos e potenciais causado por falta de compreensão de que quanto mais oportunidades forem dadas aos(às) jovens, mais nosso país será próspero. É necessário, o quanto antes, permitir que o orçamento brasileiro seja investido em políticas básicas de educação, geração de trabalho e direitos da juventude.

Má gestão da pandemia: evasão escolar

Essa falta de visão da elite e dos gestores brasileiros é a responsável por cortes em políticas de fortalecimento da educação, por exemplo, como a interiorização do Ensino Superior e para o Programa Nacional de Educação para a Reforma Agrária (Pronera). A pandemia agravou ainda mais o estado da educação do campo – em que mais de 2 mil escolas rurais são fechadas por ano -, pois tornou central o uso da internet e de computadores no processo pedagógico para evitar o contágio do novo coronavírus nas escolas.

No entanto, 72% dos domicílios rurais da agricultura familiar não têm acesso à internet, de acordo com o Censo Agropecuário de 2017, e segundo a PNAD 2019, 59% da população rural têm apenas um celular em casa (e 61% nem isso) – ferramenta insuficiente para assistir aulas e fazer leituras didáticas, ainda mais se houver mais de um(a) estudante no mesmo lar. Sem internet, sem computadores, com professores das redes públicas não orientados pelo Ministério da Educação para o grande desafio virtual, jovens estudantes rurais se viram desmotivados e sem esperança de continuar os estudos.

Cerca de 4 milhões de estudantes brasileiros(as), com idade entre 6 e 34 anos, abandonaram os estudos em 2020, o que representa uma taxa de 8,4% de evasão escolar, de acordo com pesquisa da Datafolha. Outro resultado visível é a baixíssima participação no Enem de 2021 de jovens pretos (apenas 11,7%), pardos (apenas 42%) e de baixa renda (apenas 26,5%), os números mais baixos desde 2012, conforme levantamento do Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior.

Escolher quem prioriza a agricultura familiar

Mesmo com um cenário desolador para a juventude rural, o presidente Jair Bolsonaro extinguiu, com um decreto em agosto de 2020, o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural, documento elaborado pela CONTAG, MPA, MST e outros movimentos da juventude camponesa com reflexões e propostas para garantir a permanência no campo com qualidade de vida.

E mesmo com o aumento da fome no Brasil e todas as dificuldades impostas aos agricultores e agricultoras familiares de nosso país, Bolsonaro vetou não apenas um, mas dois Projetos de Lei que propunham medidas emergenciais de amparo a agricultores e agricultoras familiares que foram impactados(as) economicamente pela pandemia da Covid-19: o PL 823/2021 (vetado no dia 17 de setembro de 2021) e o PL 735/2020 (vetado em 25 de agosto de 2020).

Por isso, nesse dia 22 de setembro, chamamos a juventude do campo, da floresta e das águas para refletir e conversar com sua família, seus amigos e amigas e sua comunidade sobre a necessidade de saber eleger gestores públicos que reconheçam a importância da agricultura familiar para a segurança e soberania alimentar de nosso país e para a preservação do meio ambiente, e da juventude rural como protagonista e sucessora do desenvolvimento rural sustentável e solidário.

FONTE: Mônica Bufon – secretária de Jovens da CONTAG

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